Blog duma gaja... bem... esquisita, estranha, tarada:) Enfim... queer!

3.02.2006

Profissão: jornalista

Eu que me dediquei por uns tempos a estudar jornalismo, não tanto a sua prática quanto a sua forma de produção, e que me fartei de rir com a forma mítica como os jornalistas se encaram a si próprios (que, aliás, conseguem difundir muito bem - veja-se os jornalistas a comentar as limitações que os tribunais lhes impõem), não posso deixar de citar um excerto dum post da Fernanda Câncio, num exercíco de auto-análise muito curioso, sobre algo que é perceptível de fora mas que é raro vindo de dentro:
"a traição de truman, no entanto, é só uma caricatura da sempre traiçoeira promessa de todo o jornalista ao entrevistado, tanto mais traiçoeira quanto mais bem sucedida na sua ilusão empática (ilusão em que os dois, jornalista e outro, se iludem).
fale para mim, só para mim. eu oiço. estou aqui para ouvir. estou aqui para compreender e absorver.estou disponível. estou só para si.
isto tem um tempo: o tempo da utilidade.
não é raro os entrevistados apegarem-se a quem assim lhes manifesta o penhor de uma quase impossível entrega (em troca da deles, claro).
mas isto liga-se e desliga-se. como um interruptor.
e depois dessa entrega impossivelmente laboriosa, impossivelmente inteira, queremos descanso. queremos o fim.
penso nisso como um mergulho numa longa piscina, um longo mergulho em que sustenho o ar até ao limite, até à meta, até que a pressão do sangue e da asfixia me tiram dali.
depois disso não tenho mais uso para aquilo. é pura delicadeza que me impede de o dizer e de agir em conformidade.
percebo o truman. conheço em mim a mesma crueldade."
Só que não é crueldade. É profissionalismo - e é, ou deveria ser, a modalidade mais laica da escuta confessional.