Blog duma gaja... bem... esquisita, estranha, tarada:) Enfim... queer!

4.21.2007

Recriemo-nos

Sugestão de mais um antiguinho da Homes (de 96): "Appendix A:". Trata-se da compilação em livro duma série de material, da sua autoria, que lhe serviu de inspiração durante os 5 anos que demorou a escrever o perturbante "O fim de Alice". Mais um sinal de como esta senhora era realmente muito interessante (digo era por razões que já aqui apontei).

4.12.2007

Ensinamentos do Brasil



25 deputados federais, 2 senadores, representantes do governo federal, do movimento de direitos humanos, de mulheres e militantes do movimento de gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais (GLBT) participaram do lançamento da Frente Parlamentar pela Cidadania GLBT no Congresso Nacional, nesta quarta-feira, 22 de Março, as 13h30, no Salão Nobre da Câmara dos Deputados.

A Frente Parlamentar pela Cidadania GLBT é o novo nome da Frente Parlamentar pela Livre Expressão Sexual, instituída em outubro de 2003, na última legislatura. A Frente é uma articulação de deputados federais e senadores que defendem os direitos humanos e a cidadania plena para a população GLBT. Seu objetivo é aprovar no Congresso Nacional leis que garantam os direitos dos homossexuais. Hoje, a Frente conta com 187 deputados federais e 15 senadores.

Urgente legislação clara contra discursos de ódio

João César das Neves foi absolvido da acusação de difamação com publicidade que lhe moveu a Opus Gay e eu própria, na sequência dum conjunto de artigos de opinião publicados no DN onde César das Neves associava a homossedxualidade à pedofilia, numa altura em que despoletava o caso Casa Pia, contribuindo assim para um incitramento ao ódio e à violência contra os homossexuais. Os tribunais tinham considerado já há algum tempo que não existia legitimidade para acusar da parte da Opus Gay e consideraram agora o mesmo a meu respeito. A opinião dos tribunais considerou que não existiam nos artigos menção directa, quer à associação, quer a mim, e recusou-se a abrir espaço a qualquer menção indirecta (apesar de ser também essa a posição inicial do Ministério Público), apesar destes referirem se referirem sistematicamente a todos os homossexuais.
Ora, quando alguém promove o ódio contra todo um grupo social e não existe claramente na lei espaço legal para considerar legitimamente ofendida, nem uma associação que estatutariamente defende o dito grupo, nem um membro desse grupo, algo vai mal - interrogamo-me se, caso fose outro o grupo social ofendido, por exemplo os juízes, haveria assim tanta dificuldade em considerar que, quer associações da classe, quer juízes em particular, teriam legitimidade para se sentir ofendidos...
Nesse sentido, é urgente a aprovação duma lei contra todo o tipo de discursos de ódio, à semelhança do que já existe contra os discursos racistas, para que seja claramente estabelecido o direito à reparação do bom nome, e a uma vida em paz e segurança, de todos os grupos sociais socialmente mais frágeis, quer através dos seus representantes colectivos, quer através de queixas individuais.

Filmes por casa

Oublier Cheyenne - lésbico político francês, muito pertinente numa altura em que o desemprego cresce a olhos vistos, mesmo nas classes médias.
Saving Face - lésbico chino-americano muito curioso, pela forma como cruza as discriminações lésbicas com os preconceitos e aspirações chineses na América.
E César Monteiro (já sei, é uma descoberta tardia, mas antes tarde que nunca:)

Ar fresco

Também graças à C., "No me llames cariño" de Isabel Franc/Lola Van Guardia, mais um divertido policial lésbico, que consegue ainda a façanha de reflectir de forma pouco ortodoxa sobre as políticas estatais de luta contra a violência doméstica, ou, melhor dito, a violência contra as mulheres.

Aplausos

Graças à C. tive acesso a dois artigos a aplaudir: um sobre Homofobia de Daniel Sampaio, que finalmente se digna a falar do sofrimento dos homossexuais e não só e quase exclusivamente dos seus pais, como o fez num dos seus livros que tanto critiquei; um outro artigo, sobre intersexos, na revista do Expresso (peço desculpa mas não me lembro do autor), o primeiro em Portugal sobre o tema segundo julgo saber - apenas com um senão: Mário Sousa, destacado investigador e homem de posições habitualmente muito sensatas, apelida de radicais as posições que defendem que se deve dar tempo e permitir aos sujeitos em causa a opção por um determinado género, no futuro (nos casos em que não haja urgência médica); não considera, nem por um segundo, que alguém possa não querer optar por um só género determinado e prefira viver como nasceu, como intersexo, aplicando-lhe antes a prepotência médica e social da imposição do género sem apelo.
E ainda no Expresso, um artigo sobre transexualidade de Sarah Adamopoulos.

Tese

Enquanto se aguardam teses sobre literatura homoerótica lésbica portuguesa, deixo aqui o link para a tese de um amigo, uma versão gay, a ler.

O assassínio da política I

Que importa isso? [sistemas que conduzem a gostos cruéis] – retorquiu o bárbaro. – Nós, afinal, não somos senhores dos nossos gostos? Não devemos ceder ao império dos gostos que recebemos da natureza, da mesma forma que a copa altiva do carvalho se verga ao sopro da aragem? Se a natureza se ofendesse com tais gostos, não no-los teria inspirado; é impossível termos recebido da natureza um sentimento que serve para a ultrajar; e, a ser assim, podemos entregar-nos a toda a espécie de paixões, por muito violentas que elas sejam, certos de que todos os inconvenientes produzidos pelo seu impacte fazem parte dos planos da natureza da qual somos órgãos involuntários. Que se nos dá das consequências dessas paixões? Quando buscamos deleite numa acção, não temos de olhar às consequências.
Eu não falo das consequências – atalhei bruscamente - , falo da coisa em si; sendo vós o mais forte, sentindo prazer na dor que provocais, em virtude de tais princípios de crueldade, tudo com o objectivo de alargar as vossas sensações, é evidente que, insensivelmente, chegareis ao ponto de as produzirdes sobre o objecto que vos serve com um grau de violência capaz de lhe arrancar a vida.
- Não o nego. Tal significa que, mediante os gostos dados pela natureza, terei servido os desígnios da natureza, a qual, realizando as suas criações através de destruições, só me inspira esta quando tem necessidade das outras; quer isso dizer que, duma porção de matéria oblonga, terei formado três ou quatro mil círculos ou quadrados. Haverá nisso algum crime, Teresa? Poderá chamar-se crime a uma coisa que serve a natureza? Terá o homem poder de cometer crimes? Quando, preferindo a sua felicidade à dos outros, derruba e destrói o que encontra pela frente, que mais não faz ele do que servir a natureza, cujas inspirações principais e mais certas lhe ditam que seja feliz, à custa de quem for? O sistema do amor ao próximo é uma quimera que devemos ao cristianismo e não à natureza; o seguidor do Nazareno, atormentado, infeliz e, por isso, numa situação de fraqueza que o força a exigir tolerância e humanidade, esse não pode deixar de estabelecer essa fabulosa relação dum ser para com outro; é um modo de preservar a vida e de ser bem sucedido. Mas o filósofo não admite essas relações gigantescas; como se vê só a si próprio, é a si que tudo refere. Se poupa ou acarinha momentaneamente os outros, fá-lo sempre relativamente ao lucro que deles quer tirar; se não precisa deles, se a força que tem lhe dá a superioridade, abjura para sempre de todos esses belos sistemas da humanidade e da bondade, aos quais só por política se sujeitava; não receia chamar tudo seu, atrair a si tudo quanto o rodeia e, custem o que custarem os outros, ele satisfaz os seus prazeres sem exame algum e até sem remorsos.
(…)
- Por mais que digais, padre, nunca aceitarei essa lubricidade destrutiva.
- Porque receias ser vítima dela, e isso é egoísmo; mudemos de papéis e terás de aceitar; interroga o cordeiro: nunca ele admitirá que o lobo tem o poder de o devorar; pergunta ao lobo qual a serventia do cordeiro: responderá que serve para ele devorar. Lobos a comer cordeiros, cordeiros devorados pelos lobos, o forte a sacrificar o fraco, o fraco vítima do forte, tudo isso é natureza, tudo isso são as palavras e os desígnios da Natureza; uma acção e uma reacção perpétuas, uma série de vícios e de virtudes, um perfeito equilíbrio, numa palavra, resultante da igualdade entre o bem e o mal sobre a terra; equilíbrio essencial à continuação dos astros, à vegetação, sem o qual tudo seria instantaneamente destruído. Muito espantada havia de ficar a natureza, se algum dia pudesse pensar nestas coisas e se lhe disséssemos que tais crimes que a servem, que tais actos por ela exigidos e inspirados são punidos por leis consideradas imagens das suas próprias leis. «Ó imbecil», responderia ela, «dorme, bebe, come e comete sem medo esses crimes, quando te apetecer; essas pretensas infâmias são do meu inteiro agrado e desejo-as, porque sou eu quem as inspira. Não te cabe a ti regular o que me irrita ou o que me deleita; fica sabendo que nada há em ti que não seja meu, nada tens que eu não te tenha dado, por motivos que não te cabe conhecer; a mais abominável das tuas acções é, como as mais virtuosas doutras, uma maneira como outra qualquer de me servires. Portanto, não te reprimas, despreza as leis, as convenções sociais e os deuses; dá-me ouvidos a mim e convence-te que, a meus olhos, só existe um crime: a oposição ao que eu te inspiro, pela resistência ou pelos sofismas que me oponhas.»
(…) mas há mais, Teresa: quanto mais terrível nos parece uma acção, quanto mais ela contraria os nossos usos e costumes, rompe os freios, choca as convenções sociais, quanto mais fere as pretensas leis da natureza, mais útil será à mesma natureza. Só pelo crime ela recupera os direitos que a virtude incessantemente desrespeita. Um crime leve, próximo da virtude, só muito lentamente estabelecerá o equilíbrio indispensável à natureza; um crime capital, esse contrabalança o peso da virtude que poderia destruir o equilíbrio. Não tem, pois, razões para temer aquele que congemina um crime qualquer ou aquele que acabou de o cometer; quanto maior tiver sido o crime, melhor servirá a natureza. (p. 184-187), "Justine", Sade

In(Fem)land Empire

Estas coisas continuam a surpreender-me, devo ser mesmo ingénua... Como é que não vejo ninguém a afirmar que este filme é uma reflexão radicalmente feminista?! Não só é afirmado explicitamente o poder das mulheres (na canção final), como o filme encerra ainda com a imagem duma face duma mulher negra (símbolo por excelência dum feminismo mais diversificado), como, principalmente, todo o filme é sobre como representar o desejo feminino, ou melhor, como representar o desejo com as contribuições do feminino, as suas formas de identificação, as suas formas de encenação, as suas relações com os medos, as suas formas de diversificação - que mais pode significar o centramento do filme em Laura Dern, à procura de si, como mulher e actriz, e transmitindo essa sua procura a uma actriz mais nova?
O filme é radicalmente feminino porque, em vez de responder teoricamente a estas questões re-presenta-as, cinematografiza-as, transfere os seus mecanismos (do olhar feminino) para os mecanismos cinéfilos (do olhar do realizador e dos espectadores). Um portento que dará muito que falar.